Não se pode dizer, nem em meio de qualquer equívoco, que o desporto angolano não existia antes do 4 de Abril de 2002, data em que foram celebrados os Acordos que viriam a catapultar o país para um clima são e propenso à definição de políticas de desenvolvimento mais concretas e realísticas.
Porém, vamos convergir em reconhecer que, a partir dessa altura, as
coisas ficaram mais facilitadas, sendo que ficaram quebradas as
limitações à prática de um desporto mais sadio e utilitário.
Vislumbrava-se no horizonte o amanhecer de um novo dia, em que o
estertor da guerra passaria testemunho ao sorriso da paz.
Competitivamente
falando, o país deu sequência à saga vitoriosa nas modalidades em que
sempre se destacou. Refira-se ao basquetebol, andebol, xadrez e em
outros desportos de caris individual, que sempre souberam guindar o nome
de Angola para os píncaros da fama.
É evidente que no basquetebol,
a nossa "galinha de ovos de ouro”, paramos em 2013, sendo que no
cômputo dos 11 títulos no palmarés, bom número destes foi alcançado no
tempo da "outra senhora”. Seja como for, isto não tem relação com o
tempo de guerra ou da paz, resulta, simplesmente, do cumprimento de um
ciclo que, ruim ou prazenteiro, podia ocorrer em qualquer
circunstância.
No plano interno, a competição ganhou outro
impulso. Pese embora do ponto de vista participativo exista um incómodo
centralismo luandense, é importante que tomemos nota positiva do
surgimento do Recreativo do Libolo, que no pouco tempo da sua vigência,
puxou dos galões e fez finca-pé aos papões cá do burgo.
Na verdade,
sendo a "bola ao cesto” a modalidade de maior expressão pelo
continente, quando se fala de Angola, seria bom que tivesse maior
massificação interna, e, talvez, um campeonato mais explosivo e
inclusivo. O quadro actual deixa claro, sobretudo com o fim da turma do
Cuanza-Sul, que a modalidade está, do ponto de vista evolutivo, resumida
à capital.
No andebol, as nossas Pérolas conservam a aura
vencedora. Jamais deixaram cair os créditos em mãos alheias,
representando com elevada dignidade o nome de Angola em todos os palcos
em que se façam representar, falemos da selecção ou dos clubes. No que
se refere ao crescimento interno, a modalidade, convenhamos, tem linha
orientadora.
Entretanto, não pode haver dúvidas que foi mais no
capítulo de infra-estruturas que o país registou maior crescimento em 19
anos de paz. Quer se fale de estádios de futebol, quer se fale de
quadras polidesportivas, deu-se um passo de gigante no período que nos
leva de Abril de 2002 aos dias actuais.
A organização do
Afrobasket’2007 levou à construção de quatro pavilhões multiusos nas
províncias de Cabinda, Benguela e Huíla, o que acabou por ser um
verdadeiro balão de oxigénio. Pois, se Luanda se gabava da imponência da
Cidadela Desportiva, as outras províncias não dispunham de quadras de
dimensões internacionalmente recomendadas.
No clima anterior, não
foi dado este passo, porque as competições de foro internacional estavam
circunscritas a Luanda. A paz abriu as portas para que se quebrasse o
conceito que, durante muito tempo, infundia a percepção de que Angola
era Luanda. O Afrobasket’2007 foi, em termos de História, o que se
disputou em mais recintos, em mais cidades.
Mas o maior de todos
os pavilhões, e com um toque arquitectónico super-moderno, foi
igualmente erguido nos últimos 19 anos. O multiusos do Kilamba recebeu o
mundial de hóquei em patins disputado em 2013, e hoje quase tirou lugar
ao gimnodesportivo da Cidadela, catalogada, por nossa conta e risco,
como a sala das maiores alegrias desportivas que o país já viveu.
Arena do Kilamba VS Cidadela
Quando
nos primórdios dos anos 70 víamos a subir aos céus, no antigo bairro
Indígena, o pavilhão da Cidadela, era para receber o Campeonato Mundial
de hóquei em patins de 1974. A organização dessa edição estava confiada a
Portugal, e decorreria na sua província ultramarina de Angola.
As
convulsões do 25 de Abril do mesmo ano, viriam a precipitar as coisas. O
campeonato disputou-se em Portugal continental. A Cidadela, concluída,
serviu mais, ao longo dos anos, outros desportos, que a modalidade
responsável pela sua construção.
Também o hotel construído ao
lado (prédio da antiga DNIC) para receber as delegações participantes,
serviu dossiers judiciais, até que um dia, com as fundações ocas, veio a
desabar. Em 2013 muitos esperavam que a Cidadela também recebesse
alguns jogos do campeonato, quanto mais não fosse para lavar a sua
honra, a sua glória. Mas esta é outra conversa.
CAN’2010
o maior desafio
Em
2008, seis anos depois do estabelecimento da paz, Angola assumia, em
Accra, capital do Ghana, a organização do Campeonato Africano das Nações
de 2010, o que foi, prontamente, aceite pelo Comité Executivo da
Confederação Africana de Futebol.
A decisão levantou algum pomo de
discórdia. Pois, para algum segmento da sociedade, o país, ainda com as
feridas abertas pela guerra por sarar, tinha outras prioridades. Justino
Fernandes, à época presidente da Federação Angolana de Futebol, António
Mangueira e Rui Costa foram imunes a todas as criticas. Aliás, não
tinham como, porque o compromisso já estava assumido.
O CAN’2010
foi responsável pela construção de quatro modernos estádios,
nomeadamente o 11 de Novembro (Luanda), O’mbaka (Benguela), Chiazi
(Cabinda) e Tundavala (Huíla). Todos estes projectos eram impensáveis no
tempo em que víamos o país a tentar escapar da agressão de uma guerra
atroz, de consequências incalculáveis.
Aqui neste quesito, também se
pode aferir que o país saiu vencedor, apesar de no plano competitivo
não ter ido para lá dos quartos-de-final, arrumado pelo Ghana, naquele
sprint de Asamoah Gian, que anulou o "nosso” Kaly, para o golo fatal e
de triste memória.
Os estádios do CAN estão aí, para servir o
futebol nacional, ainda que em certos casos se constate alguma inércia
no seu pleno aproveitamento, situação a ver com a falta de políticas de
gestão e exploração melhor concebidas e orientadas.
Enfim, em 19
anos de paz os ganhos no sector desportivo foram vários e visíveis aos
olhos de todos, sendo que só não os enxerga quem, deliberadamente, não
queira, porque feito refém de um cepticismo doentio e bacoco...
Fonte: JA