Vários cidadãos estrangeiros estão entre os envolvidos na rebelião armada registada na madrugada de sábado na vila mineira de Cafunfo, município do Cuango, província da Lunda-Norte. O Jornal de Angola apurou que entre os detidos estão cidadãos estrangeiros, com destaque para os da República Democrática do Congo (RDC).
Uma fonte deste diário avança que a ideia dos insurrectos é criar uma
guerrilha no Leste do país e que a escolha das áreas não é feita por
acaso. "Como há diamantes na zona, conseguem alimentar facilmente as
suas acções”, frisou a fonte, acrescentando que, contrariamente ao que
se quer fazer crer, as pessoas envolvidas não estão interessadas em
fazer manifestações, mas sim em "actos de rebelião, de guerra, acções
bélicas claras”. "Às 4h00 de madrugada ninguém reivindica nada
pacificamente, ninguém se manifesta.
A essa hora ataca-se,
faz-se terrorismo puro e duro”, disse, sublinhando que a unicidade do
Estado é um princípio que não deve ser questionado, nem ser colocado em
causa. Na madrugada de sábado, cerca de 300 indivíduos do
auto-denominado "Movimento do Protectorado Lunda-Cokwe” atacaram a
esquadra policial de Cafunfo. Durante o ataque, morreram quatro
insurgentes e outros dois faleceram no hospital, totalizando, até ao
momento, seis mortes.
O motim aconteceu quando indivíduos
dessa organização sem estatuto legal, no quadro da legislação em vigor
na República de Angola, se dirigiram à esquadra policial para ocupá-la e
içar uma bandeira do movimento. Na sequência, foram detidos 16
revoltosos, cujos processos-crime estão em preparação e serão remetidos
ao Ministério Público.
Protectorado é uma falácia
À
reportagem do Jornal de Angola, um historiador, que preferiu o
anonimato, considera "uma falácia” o Protectorado Lunda-Cokwe. Segundo o
especialista, residente no município de Lucapa, província da
Lunda-Norte, na segunda metade do século XIX, fruto das disputas entre
as grandes potências coloniais, o princípio do "direito histórico” foi
substituído pelo princípio da "ocupação efectiva”. "Isto é, para
reclamar como colónia um território em África não era suficiente afirmar
que cheguei primeiro, era necessário provar que tinha o domínio do
mesmo”, esclareceu.
Um dos mecanismos para provar essa
"ocupação efectiva”, acrescentou, era apresentar documentos em que as
populações autóctones reconheciam estar sob protecção de uma potência
europeia. "Portugal, igual aos outros colonizadores, assinou um conjunto
de tratados com as populações, conseguindo assim impor à força a sua
autoridade”, disse.
Frisou que, nesses instrumentos, os
territórios passaram a ser protectorados portugueses, apontando como
exemplos Cabinda, Lunda, os Dembos e outras regiões do país. "No caso da
Lunda, aconteceu quando o capitão Henrique Dias de Carvalho, no início
da década de 1880, foi para lá. Por isso, reclamar ‘autonomia’ porque
assinaram sob coacção esse instrumento com Portugal, é um argumento que
não colhe e seriam centenas de realidades históricas em Angola, em
particular, e em África, em geral, que usariam o mesmo argumento, o que
significa que teríamos que desmembrar praticamente todos os Estados”,
explicou.
Para o historiador, a expressão "Lunda-Cokwe” é
outra invenção, na medida em que existe o povo Lunda, que fala a língua
lunda, e o povo Cokwe, que fala a língua cokwe. "O Império Lunda foi
dominante até ao século XIX, altura em que a expansão Cokwe inverteu o
domínio na região. O título do soberano da Lunda é Mwata Yamvo. O título
do soberano dos Cokwe é Mwachtissengue. Reclamar um estado Lunda-Cokwe é
falsificar a História. A ignorância torna a pessoa cega e seguidora de
qualquer discurso, principalmente em tempo de dificuldades económicas e
sociais”, lembrou.
O historiador deixou claro que não é
apologista da violência da Polícia nem contra a Polícia. "Por isso,
expresso o meu repúdio. Agora, o que me parece estúpido é as pessoas
seguirem movimentos políticos sem o mínimo de conhecimento da História”,
afirmou.
O especialista considera estranho uma manifestação de
pessoas armadas ser realizada de madrugada. "O comandante da Polícia de
Intervenção Rápida, desarmado, foi abordar os indivíduos, apelando
pacificamente, tem o crânio aberto por machadada. Outro oficial da
Polícia foi gravemente ferido à catana no braço, corre o risco de
amputacão. Então, de onde a violência partiu?”, questionou.
Fonte: JA